Portugal é um dos países com maior grau deincumprimento das regras orçamentais do Pacto de Estabilidade e Crescimento(PEC), segundo o indicador de cumprimento realizado pelo European Fiscal Board.
O indicador fornece uma pontuação de 0% (totalincumprimento) a 100% (total cumprimento), calculando a média dos anos (1998 a2021) e avaliando quatro regras orçamentais do PEC.
O país com o maior grau de incumprimento éFrança (22%). Em seguida, Itália (26%), Grécia (29%), Portugal (30%) e Hungria(38%). A seguir, estão Espanha, Bélgica e Áustria (os três com 39%).
Já o país com maior grau de cumprimento é Luxemburgo(93%), seguido pela Suécia (92%), Dinamarca (83%), Estónia (76%) e Finlândia (73%).
As quatro regras são a do défice orçamental,dívida pública, saldo fiscal estrutural e da despesa pública.
– Défice Orçamental
Um país é considerado cumpridor da regra dodéfice orçamental se (i) o saldo orçamentário for igual ou superior a -3% doPIB ou se (ii) um excesso abaixo de -3% do PIB for limitado a um ano. A figura1 mostra o tamanho do desvio desta regra em % do PIB em Portugal e na zona euro.Um sinal positivo (negativo) significa que o saldo orçamental está acima(abaixo) de -3% do PIB.
Figura 1 – Desvio em, % do PIB, da Regra doDéfice Orçamental (1998-2021)
Fonte: Comissão Europeia.
Veja que, desde 1998, Portugal só teve déficeorçamental em 3% do PIB (ou acima) em 1999, 2007, 2016-2019 e 2021.
– Dívida Pública
Um país é considerado cumpridor da regra dadívida pública se a relação dívida/PIB for inferior a 60% do PIB ou se oexcesso acima de 60% do PIB tiver uma diminuição de 1/20 em média nos últimostrês anos. A figura 2 mostra o tamanho do desvio (para Portugal e a Zona Euro)como a diferença entre a relação dívida/PIB e aquela exigida pela regra dadívida. Um sinal positivo (negativo) significa que a relação dívida/PIB realestá abaixo (acima) daquela exigida pela regra da dívida.
Figura 2 – Desvio em, % do PIB, da Regra daDívida Pública (1998-2021)
Fonte: Comissão Europeia.
Observe que, desde 1998, a dívida pública dePortugal só ficou abaixo de 60% entre 1998 e 2001.
– Saldo Fiscal Estrutural
O saldo fiscal estrutural é a diferença entreas receitas e despesas do governo corrigidas pelos efeitos que poderiam seratribuídos ao ciclo económico e a eventos económicos (que possam contrair aeconomia) pontuais.
Um país está em conformidade com esta regra seo saldo orçamental estrutural for igual ou superior ao objetivo de médio prazo(OMP) ou, se estiver abaixo do OMP, o seu esforço orçamental estrutural (ouseja, a variação do saldo estrutural) for igual ou superior ao valor dereferência exigência (0.5% do PIB). A figura 3 mostra o tamanho do desvio em %do PIB potencial. Um sinal positivo (negativo) significa que o país está acimado seu OMP ou o seu esforço fiscal estrutural é superior (inferior) aorequisito de referência de 0.5% do PIB.
Figura 3 – Desvio em, % do PIB, da Regra doSaldo Fiscal Estrutural (1998-2021)
Fonte: Comissão Europeia.
– Despesa Pública
Um país é cumpridor desta regra se a taxa decrescimento anual das despesas primárias do governo (líquida de medidas dereceita discricionárias e não recorrentes) for igual ou inferior à média de 10anos da taxa nominal de crescimento do produto potencial menos a margem deconvergência necessária para ajustar o MTO.
A figura 4 mostra o tamanho médio do desvio em% do PIB. Um sinal positivo (negativo) significa que o crescimento anual dadespesa pública líquida está abaixo (acima) do crescimento do produto potenciala médio prazo.
Figura 4 – Desvio, em % do PIB, da Regra daDespesa Pública (1998-2021)
Fonte: Comissão Europeia.
A figura abaixo mostra a percentagem de anos(entre 1998 e 2021) em que Portugal esteve em conformidade com cada uma dasquatro regras:
Figura 5 – % de Anos em Conformidade com asRegras Orçamentais da PEC – Portugal (1998-2021)
Deficit (Défice Orçamental), Debt (DívidaPública), Structural (Saldo Fiscal Estrutural), Expenditure (Despesa Pública).
Fonte: Comissão Europeia.
Como mencionei aqui e aqui, o mecanismo por trás do funcionamento do euro produz um incentivo para queseus membros se endividem ao longo do tempo. Sim, há períodos em que a maioriados países diminuem seu endividamento (embora muito lentamente), maseventualmente aumentam para um nível ainda maior (de forma que, no longo prazo,o endividamento aumenta).
E Portugal é um dos países com maiores gastose endividamento da UE. Não é de se surpreender que seja um dos que menos cumprem com as regras do PEC.
Regras que impõem disciplina aos governos raramente sãoobedecidas pelos mesmos. Não interessa se há um Tratado sobre o Funcionamentoda UE, cheio de leis. Se for conveniente aos governos (ou a quaisquer entidadesgovernamentais), vão desobedecer. Por Exemplo, o artigo 123º deste tratadoafirma que o BCE não pode comprar diretamente os títulos de dívida dos governoszona euro. No entanto, é justamente isto que o BCE tem feito há naos.
Ou seja, não importa quantas regras sejamescritas em papéis ou o quanto rigorosas sejam. Os governos sempre encontrarãoalguma desculpa para desobedecê-las. E Portugal não é exceção.
André Marques