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Daniel Lacalle | Os Bancos Centrais Estão a Comprar Ouro para Mitigar os Prejuízos em seus Balanços

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Em 2022, os bancos centrais compraram a maior quantidade de ouro da história recente. Segundo o World Gold Council (WGC), as compras de ouro pelos bancos centrais atingiram um nível não visto desde 1967. Os bancos centrais compraram 673 toneladas em um mês e, no 3º trimestre, o número chegou a 400 toneladas. Isso é interessante porque o fluxo dos bancos centrais desde 2020 vinha sendo eminentemente de vendas líquidas.

 

Por que os bancos centrais estão a adicionar ouro às suas reservas? Pode haver diferentes fatores.

 

A maior percentagem de reservas da maioria dos bancos centrais são dólares americanos, que geralmente vêm na forma de títulos do Tesouro dos EUA. Faria sentido para alguns dos bancos centrais, especialmente o da China, decidir [ter menos exposição ao] dólar americano.

 

As altas reservas cambiais da China são uma fonte importante de estabilidade para o Banco Central da China. A alta quantia de dólares americanos (US$ 3.1 trilhões) pode ter sido um fator chave de estabilização em 2022, mas pode ser demais se os próximos dez anos trouxerem uma onda de desvalorização do dinheiro que nunca aconteceu antes.

 

Os bancos centrais têm falado sobre a ideia de emitir uma moeda digital [Nota do editor: central bank digital currency – CBDC] , o que mudaria completamente a forma como o dinheiro funciona hoje. Ao emitir uma moeda digital diretamente na conta do cidadão no banco central, a instituição financeira teria todo o acesso às informações dos poupadores e, mais importante, poderia acelerar o mecanismo de transmissão da política monetária ao eliminar os canais que impedem o aumento da inflação de preços: o canal bancário e o gargalo da demanda por crédito. O que tem impedido a inflação de preços aumentar muito mais é que a forma como a política monetária é repassada é sempre freada pela demanda por crédito no sistema bancário. Isso, obviamente, levou a um enorme aumento dos preços dos ativos financeiros e ainda fez com que os preços [ao consumidor] disparassem quando o crescimento da oferta monetária foi usado para pagar os gastos e subsídios do governo.

 

Se os bancos centrais começarem a emitir moedas digitais, o nível de destruição do poder de compra das moedas visto nos últimos 50 anos será extremamente pequeno em comparação com o que pode ocorrer com o controlo desenfreado do banco central.

 

Em tal ambiente, o status do ouro como reserva de valor seria inigualável.

 

Há mais razões para comprar ouro.

 

A liquidez era o calcanhar de Aquiles das criptomoedas. Alguns aumentos de taxas de juro pelo [Federal Reserve (Fed) – o banco central dos EUA] rapidamente refutaram a ideia de que as criptomoedas só poderiam subir de valor. As criptomoedas não combateram a expansão monetária; ao contrário, [o aumento dos preços das criptomoedas era] um de seus efeitos. O ouro [é] agora uma das poucas verdadeiras reservas de valor remanescentes.

 

O desempenho do ouro em dólares americanos pode ter dececionado os investidores em 2022 (embora tenha sido estável). Porém, em um ano de amplas quedas de ativos financeiros, o ouro subiu em euros, libras, ienes e na maioria das moedas emergentes.

 

Os bancos centrais [estão a comprar] ouro porque podem estar preparar-se para um período sem precedentes de devastação monetária.

 

O Financial Times afirma que os bancos centrais já estão a sofrer perdas significativas como resultado da queda do valor dos títulos que detêm em seus balanços. No final do 2º trimestre de 2022, o Federal Reserve havia perdido US$ 720 mil milhões, enquanto o Banco da Inglaterra havia perdido £ 200 mil milhões. O Banco Central Europeu (BCE) está neste momento a rever as suas finanças, prevendo-se que também incorra em perdas significativas. O BCE, o Federal Reserve dos EUA, o Banco da Inglaterra, o Banco Nacional Suíço e o banco central australiano “agora enfrentam possíveis perdas de mais de US$ 1 trilhão no total, à medida que títulos antes lucrativos transformam-se em passivos”, de acordo com a Reuters.

 

Se um banco central sofrer uma perda, pode preencher a lacuna usando quaisquer reservas disponíveis de anos anteriores ou solicitando ajuda de outros bancos centrais. Semelhante a um banco comercial, pode passar por dificuldades significativas; no entanto, um banco central tem a opção de recorrer aos governos como último recurso. Isso implica que o buraco será pago pelos pagadores de impostos, e os custos são astronómicos.

 

A onda de destruição monetária que pode resultar de um novo recorde na dívida global, enormes perdas nos ativos dos bancos centrais e a emissão de moedas digitais [pelos bancos centrais] levam a apenas um verdadeiro porto seguro com séculos de status comprovado como reserva de valor: o ouro. Isso ocorre porque os bancos centrais estão cientes de que os governos não estão a cortar gastos deficitários.

 

Esses números destacam o enorme problema trazido pelo recente uso excessivo do quantitative easing (QE) [Nota do editor: QE é a compra de ativos pelos bancos centrais através da expansão da base monetária]. Como desconheciam a realidade da solvência do emissor, os bancos centrais passaram da compra de ativos de baixo risco a preços atraentes para a compra de qualquer título soberano a qualquer preço.

 

Por que os bancos centrais aumentam suas compras de ouro exatamente quando as perdas aparecem em seus balanços? Para aumentar seu nível de reserva, diminuir as perdas e prever como as moedas digitais recém-criadas podem afetar a inflação de preços. Como comprar títulos soberanos europeus ou norte-americanos não diminui o risco de perder dinheiro se a inflação de preços continuar alta, é muito provável que a única opção real seja comprar mais ouro.

 

Os bancos centrais das nações industrializadas farão um esforço para reduzir seus balanços patrimoniais para combater a inflação de preços, mas também descobrirão que os ativos que possuem continuam a desvaloriza-se. Um banco central que está a perder dinheiro não pode expandir imediatamente seu balanço ou comprar mais títulos soberanos. Uma armadilha de liquidez foi armada. QE e taxas de juros [artificialmente] baixas são necessárias para que haja preços de ativos mais altos. [Porém, isto significa mais liquidez] e contenção financeira, [o que pode] prolongar as pressões inflacionárias, o que aumentaria a pressão sobre os preços dos ativos.

 

A ideia de que imprimir dinheiro não levaria à inflação de preços [ao consumidor] serviu de base para a miragem monetária. A evidência em contrário agora demonstra que os bancos centrais enfrentam um sério desafio: são incapazes de manter a expansão [monetária] e a inflação dos preços dos ativos, baixar os preços ao consumidor e financiar os gastos do governo ao mesmo tempo.

 

Então, por que ouro? Porque um novo paradigma na política inevitavelmente emergirá como resultado dos desastrosos efeitos económicos e monetários de anos de QE, e nem nossos ganhos reais nem nossos depósitos de poupança beneficiam-se disso.

 

A única razão pela qual os bancos centrais compram ouro é para proteger seus balanços de seus próprios programas de destruição monetária; eles não têm escolha a não ser fazê-lo.

 

 

Artigo originalmente publicado em dlacalle.com.

 

Tradução e edição de André Marques.

 

Autor: Daniel Lacalle é um economista e gestor de fundos espanhol, autor dos bestsellers Freedom or Equality (2020), Escape from the Central Bank Trap (2017), e Life in the Financial Markets (2014). É professor de economia na IE Business School em Madrid.

 

Nota: As opiniões expressas neste artigo não necessariamente vão totalmente de acordo com as da Elementum Portugal e do tradutor/editor deste artigo.

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