Daniel Lacalle | O Impacto de uma Proibição do SWIFT na Rússia e no Mundo



SWIFT (Society for Worldwide InterbankFinancial Telecommunication) é o sistema financeiro global que permitetransferências de dinheiro imediatas e seguras entre as fronteiras. É a teiaque verifica todas as transações financeiras. Ele conecta 11 mil bancos einstituições em mais de 200 países, com 40 milhões de mensagens por dia. O usodo SWIFT garante que as transações ocorram em segundos de forma segura. Cercade 1% dessas mensagens envolvem pagamentos russos, de acordo com a BBC.


Como parte das sanções do Ocidente contra aRússia, seus bancos foram banidos do sistema SWIFT. Além disto, os EstadosUnidos e a União Europeia anunciaram restrições ao banco central russo quebloqueiam o acesso a mais de US$ 600 mil milhões em reservas. O Banco da Rússiainforma que apenas 22% de suas reservas internacionais são dólares americanos,enquanto o ouro representa 23%.


O que isto significa? Por um lado, a medidavisa bloquear todas as opções do banco central para defender sua moeda de cairainda mais em relação ao dólar americano ou ao euro. Nos últimos anos, o bancocentral russo vem reduzindo sua exposição aos títulos de dívida dos EUA emudando de reservas em dólares americanos para euros e yuans, além de ouro [Notado editor: este processo é chamado de desdolarização e também tem sido feitopor outros bancos centrais nos últimos anos]. O acesso a estas reservas é mais difícil agora e, no caso do euro e do iene,provavelmente quase impossível.


Para os bancos russos, a proibição do sistemaSWIFT aumenta o risco de uma corrida bancária, pois os cidadãos temem a perdade seus depósitos e um colapso das operações diárias, mesmo que comecem a usaroutras alternativas.


No entanto, não podemos esquecer que há umimpacto importante também nos bancos europeus. De acordo com o JP Morgan, osbancos europeus têm até US$ 80 mil milhões em créditos com bancos russos. Serbanido do SWIFT não faz com que estas reivindicações desapareçam, mas se osbancos russos entrarem em um processo de descapitalização, os riscos deinadimplência se multiplicam.


Apenas três países foram banidos do SWIFT. Irã(desde 2012) Coreia do Norte e agora Rússia, ainda que parcialmente. Asexportações de petróleo e gás, bem como de outras commodities importantes,permanecem no sistema.


Sem o SWIFT, os bancos russos e o bancocentral estão efetivamente impedidos de operar em escala global, o quesignifica um risco adicional de um dominó de inadimplência dos emissores e aimpossibilidade de realizar as operações internacionais mais básicas.


No entanto, os bancos russos podem contornar osistema SWIFT e usar outras alternativas, principalmente através de um sistemaparalelo na China, chamado CIPS (Cross-Border Interbank Payments System), que facilitaas transações em yuan. De acordo com o CIPS, pelo menos 25 bancos russosrealizam transações em yuan por meio de seu sistema.


Usar o CIPS e outras ferramentas diretas ouindiretas para contornar o SWIFT tem sido uma alternativa para o Irã e a Coreiado Norte, mas não resolve o problema de acesso às reservas do banco central nemmitiga verdadeiramente a impossibilidade de realizar transações globais. O yuané usado apenas em 4% das transações globais de moeda de acordo com o BIS (BankOf International Settlements).


Os bancos russos e o banco central podemmoderar o golpe financeiro usando sistemas alternativos, mas o impacto negativonão pode ser subestimado.


Pode haver uma reação para os Estados Unidostambém. Se outros países acharem que existe uma alternativa válida ao SWIFT,eles podem se sentir compelidos a fortalecer os laços com a China.


Proibir bancos russos do SWIFT pode prejudicarmuitas economias da América Latina e do Médio Oriente, que têm profundasconexões financeiras com a Rússia. Mas há um risco para os Estados Unidos deque a alternativa CIPS (que é marginal, na melhor das hipóteses) cresçarapidamente.


Os Estados Unidos e a Europa não podem banirtotalmente o SWIFT devido à importância das exportações russas de petróleo,gás, metais e trigo. E isto pode criar inúmeros desafios que limitamsignificativamente a chamada “opção nuclear”. As grandes reservas de ouro dobanco central russo também são um fator de diferenciação em relação a outraseconomias.


Não importa como olhamos para estas sanções,não há dúvida de que há impactos transfronteiriços não intencionais e podehaver consequências negativas inesperadas para todos os envolvidos.


Não há dúvida de que a proibição do SWIFT éprovavelmente a mais severa das sanções financeiras possíveis e que não háalternativas fáceis. Mas, com o passar do tempo, também fica claro que asconsequências negativas generalizadas da guerra na Ucrânia provavelmentedurarão muitos anos.


Esta medida acelerará uma mudança financeiraglobal em direção à China? Provavelmente não no curto prazo, dado o usorelativamente modesto do yuan em comparação com a importância da China naeconomia global. Mas as ramificações dessa medida no mundo financeiro globalainda não foram totalmente compreendidas. Um sistema global de transaçõesfinanceiras permanece como líder indiscutível apenas se for verdadeiramenteglobal e de longo alcance. O impacto negativo para a Rússia é inquestionável,mas as implicações de longo prazo desta medida devem ser vistas.



Artigo originalmente publicado no site doDaniel Lacalle.


Tradução e edição de André Marques.


Autor: Daniel Lacalle é um economista e gestorde fundos espanhol, autor dos bestsellers Freedom or Equality (2020), Escapefrom the Central Bank Trap (2017), e Life in the Financial Markets (2014). Éprofessor de economia na IE Business School em Madrid.


Nota: As opiniões expressas neste artigo nãonecessariamente vão totalmente de acordo com as da Elementum Portugal e dotradutor/editor deste artigo.

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