Daniel Lacalle | A Escassez de Alimentos Pode Acontecer Devido a Intervenções Governamentais Excessivas



Muitos leram que há uma crise alimentar a aproximar-see há preocupações significativas sobre a escassez de grãos. A principal razãopara esta possível crise é a invasão da Rússia à Ucrânia. No entanto, esta nãoé toda a história.


Muitos países ao redor do mundo têm um grandedéfice de produção de cereais, que é essencial para alimentar o gado. Oprincipal culpado é o aumento da intervenção governamental que fez os custosdispararem (até em períodos de baixos preços de energia) e um nívelinsustentável de restrições que impossibilitaram os agricultores de continuar aplantar e a produzir grãos.


Em 2020, a Ucrânia produziu 4% da produçãomundial de trigo; a Rússia, 10%. Juntos, eles produzem quase tanto trigo quantotoda a UE, mas a razão é que a União Europeia (UE) tornou impossível produzirtrigo de forma económica.


De acordo com o site da UE, os principaiscustos (categorias de despesas) para a produção de cereais são sementes,fertilizantes, defensivos agrícolas e máquinas/infraestrutura. De acordo com orelatório das quintas de cereais da UE, o custo operacional total médio da UEpara os cereais foi de 635 euros por hectare em 2020. Em termos de colheitas, aUE admite que a produção de milho tem custos mais elevados a todos os níveis,exceto para a proteção das colheitas, que é mais elevado para a produção detrigo mole.


Normalmente, as quintas de cereais emeconomias com altos níveis de intervenção do governo já apresentavam perdas em2019, de acordo com o Center for Commercial Agriculture. “As perdas médias paraas quintas típicas da Argentina, Austrália, Indiana e Kansas foram de US$ 46,US$ 1, US$ 94 e US$ 16 por acre, respetivamente. Durante o período de cincoanos (US$ 114, US$ 1, US$ 231 e US$ 39 por hectare, respetivamente). As quintasalemãs tiveram os maiores custos diretos, custos operacionais e custosindiretos por hectare (US$ 535, US$ 573 e US$ 506 por hectare,respetivamente)”. Como tal, as quintas alemãs também eram antieconómicas.


Embora a maioria das quintas tenha dadoprejuízo mesmo em períodos pré-pandemia, o maior lucro obtido foi de US$ 68 poracre (US$ 167 por hectare) para uma quinta típica da Rússia.


O aumento do custo de produção veio decrescentes encargos administrativos, pressões ambientais e aumento de impostospara os agricultores em meio a períodos climáticos desafiadores, como vimos emtoda a Europa. Na Europa, os agricultores viram salários mínimos crescentes eimpostos diretos e indiretos crescentes, além de um custo crescente de energiaimpulsionado pelo custo das emissões de CO2 multiplicando-se mesmo antes de ospreços do petróleo e do gás natural aumentarem devido à guerra. O custo médiodireto e indireto aumentou mesmo nos períodos em que a o aumento dos preços dosinsumos energéticos foi baixo. Isto fez com que os produtores marginaisreagissem menos rapidamente às mudanças de preços e que muitas quintassimplesmente desistissem.


Em qualquer outra circunstância, o colapsoparcial da oferta da Ucrânia e da Rússia não teria um impacto significativo,como aponta o analista Aaron Smith. “Quão comuns são os choques de mercado destamagnitude? As exportações de trigo da Rússia e da Ucrânia representaram 7.3% daprodução global em 2020. A produção de trigo caiu 6.3% em 2010, em parte devidoa uma seca que reduziu a produção russa em 20 milhões de toneladas. Da mesmaforma, grandes declínios também ocorreram em 1991, 1994, 2003 e 2018”. Istopode evitar uma crise alimentar global, embora países como Egito, Líbano, Sudãoe outros países do Médio Oriente e Norte da África possam ter um momento muitodifícil, pois a Ucrânia e a Rússia representam entre 60% a 90% de sua oferta.


Não podemos esquecer que os protestos da“Primavera Árabe” no final de 2010 vieram depois do aumento insuportável dospreços dos alimentos. O risco de uma situação semelhante agora não é pequeno.


Os governos de todo o mundo deveriam teraprendido com essas experiências anteriores e aliviado os encargosadministrativos e tributários sobre a agricultura para permitir que o mercadoforneça flexibilidade em tempos de preocupações com o fornecimento de um ou doispaíses. Em vez disto, vimos mais rigidez, impostos e restrições mais altas quelimitaram a possibilidade de aliviar os problemas da cadeia de suprimentos.


Isto não significa que a agricultura nãoprecise de alguma regulamentação para crescer e prosperar. Isto significa que aregulamentação excessiva e os incentivos governamentais baseados em custoslimitaram a capacidade dos agricultores de enfrentar com sucesso os desafiosexternos [Nota do editor: veja como as regulações governamentais sãoprejudiciais aqui, aqui e aqui]. Aumentar o mandato de biocombustíveis queimpõe que um mínimo de 10% de toda a gasolina dos EUA venha de etanol feito demilho quando milhões podem enfrentar escassez de alimentos é uma dessasdecisões ilógicas.


A guerra na Ucrânia ou mudanças climáticasdifíceis não causariam uma escassez global de alimentos em um ambiente normalde livre comércio e facilidade de fazer negócios para os agricultores. Se hárisco de escassez de alimentos, isto vem de anos de limitação às possibilidadespara os agricultores e aumentando continuamente seus custos de produção comimpostos diretos e ocultos.



Artigo originalmente publicado no site doDaniel Lacalle.


Tradução e edição de André Marques.


Autor: Daniel Lacalle é um economista e gestorde fundos espanhol, autor dos bestsellers Freedom or Equality (2020), Escapefrom the Central Bank Trap (2017), e Life in the Financial Markets (2014). Éprofessor de economia na IE Business School em Madrid.


Nota: As opiniões expressas neste artigo nãonecessariamente vão totalmente de acordo com as da Elementum Portugal e dotradutor/editor deste artigo.

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