A inflação, especificamente a inflaçãomonetária, é tão desejada e necessária pelo Estado quanto o alimento énecessário para a nutrição humana. A inflação, mais do que a tributação, é oprincipal alimento que permite que o Estado (lenta, mas seguramente) setransforme em um grande e abrangente aparato burocrático que intervém em quasetodos os aspetos dos assuntos sociais e económicos.
Sem inflação, o Estado se vê acorrentado aoslimites do que pode confiscar por meio de impostos. Um governo limitado e nãointervencionista é, como mostra a boa economia e a história prova, vital para aliberdade, prosperidade e paz.
Mas porque o estado é inerentemente violento ecoercitivo (detendo o poder de legislar e fazer cumprir a legislação), é,portanto, inevitável que o governo, por meio de truques políticos e mentiraseconómicas, destrua um sistema monetário sólido em favor do sistema monetário fiduciárioque facilita a inflação. É por isto que o sistema monetário mais preferido do Estadoé aquele baseado em moeda fiduciária protegida da concorrência por leis decurso legal, em oposição ao dinheiro trazido pela liberdade monetária.
É também por isso que, do ponto de vista daeconomia estatista (por exemplo, economia keynesiana), a definição de inflaçãoteve de ser deliberadamente distorcida para facilitar a inflação monetária e adegradação da moeda, que alimenta o Estado com os nutrientes que ele precisapara aumentar seu tamanho em detrimento da verdade, justiça e liberdade.
– Definição de Inflação
A definição popular e de livros didáticos deinflação é um aumento generalizado dos preços de bens e serviços. Comumentemedido pelo Consumer Price Index (CPI). Esta definição não está errada em si, mas é imprecisa e deliberada e grosseiramenteenganosa.
A definição original e precisa de inflação é oaumento artificial da oferta de dinheiro (e crédito). Por artificial entende-seque a expansão da oferta de moeda não é determinada pelo mercado, mas sim poruma agência que supervisiona o sistema monetário centralizado e monopolizado –geralmente um banco central.
No atual sistema económico estatista baseadona inflação de moeda fiduciária, que existe desde 1971, quando o último vínculoentre o dólar e o ouro foi cortado [Nota do editor: veja detalhes aqui], é conveniente e necessário que o governo promova uma definição distorcida eenganosa de inflação.
Esta distorção não é coincidência, éintencional.
– Distorção Deliberada
A inflação foi deliberadamente distorcida porduas razões principais. Primeiro, o governo e sua agência monetária – o bancocentral – se protegem de qualquer culpa futura pelo aumento contínuo dos preçose pela perda de poder de compra da moeda que inevitavelmente acontece comoresultado da inflação monetária. Isto permite que o governo e seus meios decomunicação colaboradores desviem a culpa para outra coisa, com os suspeitos oubodes expiatórios de sempre: “empresários gananciosos” ou “corporações”.
Em segundo lugar, e mais tragicamente, adefinição oficial e distorcida de inflação – um aumento generalizado dos preçosde bens e serviços – esconde a verdade, impedindo assim que o público saiba quea inflação e a perda do poder de compra da moeda são uma política deliberada degoverno/banco central. E se você não souber a real causa de um problema, nãoconseguirá resolvê-lo definitivamente.
Quando a inflação machuca muito e empobrece amuitos (entre muitas outras consequências prejudiciais à sociedade), osfuncionários do governo/banco central não têm de admitir que criaram a criseinflacionária. Por exemplo, este relatório afirma que a maioria dos americanos acredita que “ganância corporativa,especulação e manipulação de preços” é a causa da atual crise de inflação nosEstados Unidos, onde a inflação de preços atingiu um recorde de 40 anos.
O mais inquietante é que o mesmo relatóriodescobriu que a maioria dos entrevistados também acredita que o governo deveintervir e resolver o problema. Em outras palavras, as pessoas querem que acausa do problema resolva o problema. Trágico.
Tal é a profundidade do mar de desinformaçãoeconómica e deseducação em que o público em geral é afogado. Talvez se opúblico soubesse que desde a criação do banco central dos EUA em 1913, o dólarperdeu mais de 95% de seu poder de compra em relação ao ouro, não culparia a crise dainflação pela “ganância corporativa”.
A agência monetária do governo e o atualsistema monetário fiduciário são a causa da situação monetária cada vez maisinflacionária e caótica de hoje. Não a ganância corporativa, especuladores,capitalismo de livre mercado, Vladimir Putin ou o clima.
Quando você tem um sistema monetáriofiduciário (o que significa que os bancos centrais podem facilmente, artificiale sistematicamente aumentar a oferta de dinheiro, quase como um truque demágica), a inflação (leve ou severa) se torna a norma. E este processoinflacionário destrói gradualmente o poder de compra da moeda resultando empreços mais altos.
O economista Hans F. Sennholz escreveu:
“Não é o dinheiro, como às vezes se diz, mas adepreciação do dinheiro — a cruel e astuta destruição do dinheiro — que é araiz de muitos males. Pois destrói a parcimônia e a autoconfiança individual àmedida que gradualmente corrói as poupanças pessoais. Beneficia os devedores emdetrimento dos credores, pois transfere silenciosamente riqueza e renda destespara os primeiros. Gera os ciclos económicos, que infligem danos incalculáveisa milhões de pessoas.”
O professor Sennholz observou ainda:
“A destruição monetária gera não apenaspobreza e caos, mas também a tirania do governo. Poucas políticas são maiscalculadas para destruir a base existente de uma sociedade livre do que adevassidão de sua moeda. E poucas ferramentas, se houver, são mais importantespara o defensor da liberdade do que um sistema monetário sólido.”
Conclusão
Em suma, um aumento generalizado dos preços debens e serviços é consequência da inflação, não a inflação em si. Foi assim quefoi classicamente (antes da economia keynesiana) definida.
Faz sentido usar os termos inflação monetáriapara especificar o aumento artificial da oferta monetária, por um lado, e usarinflação de preços para se referir a um aumento generalizado dos preços de bense serviços, por outro.
De qualquer forma, a inflação distorce a economia,rouba o poder de compra do povo e empobrece a sociedade enquanto beneficia aselites dominantes. Assim, sua definição foi deliberadamente distorcida paraenganar o público e servir melhor aos interesses secretos do governo.
A história (e o bom senso) deixa claro que ossistemas de moeda fiduciária são arranjos insustentáveis que sempre einevitavelmente falham. Como tal, duvido que o sistema global de moedafiduciária de hoje, liderado pelo dólar americano, desafie as leis económicasnaturais para resistir ao teste do tempo.
A boa notícia é que quando o padrão global dodólar fiduciário desmoronar (pela (hiper)inflação ou pelo aumento da taxa dejuros? Talvez uma combinação de ambos?), falácias económicas profundas e equívocos que surgiram em torno dele nasúltimas décadas, desmoronarão junto com ele.
Artigo originalmente publicado no MisesInstitute.
Tradução e edição de André Marques.
Autor: Manuel Tacanho é fundador da Afridom,uma startup de banco digital para a Europa e África. Ele também é um defensorde mercados livres e dinheiro sem intervenção estatal para o desenvolvimentoeconómico da África.
Nota: As opiniões expressas neste artigo nãonecessariamente vão totalmente de acordo com as da Elementum Portugal e dotradutor/editor deste artigo.