Fitch Mantém o Rating da Dívida Pública Portuguesa em BBB+

Na semana passada, a agência de classificação de risco Fitch manteve inalterado (em BBB+, com perspetiva estável) o rating da dívida pública portuguesa. Em outubro de 2022, a agência elevou o rating de BBB para BBB+, com perspetiva estável. Foi a primeira vez que isto ocorreu desde dezembro de 2017. Veja aqui a tabela de rating da Fitch.

 

A Fitch menciona que défice orçamentário “diminuiu acentuadamente em 2022” para 0.4% do PIB (face aos 2.9% do PIB em 2021). Isto foi bem acima da projeção feita pela Fitch em outubro de 2022 e da própria estimativa do Governo, que tinha apontado para um saldo negativo de 1.9%. “A redução do défice [orçamentário] foi impulsionada pelo forte crescimento nominal da economia, forte crescimento das receitas e o levantamento das medidas de apoio à Covid-19“, afirma a agência.

 

Por sua vez, estima que este ano o défice orçamentário aumente para 1.2% do PIB, na sequência da redução de impostos, dos aumentos da despesa orçamental e do pacote de apoio anti-inflação e do pacote “Mais Habitação”. Ainda assim, espera que “o défice [orçamentário] diminua em 2024”.

 

Nota do editor: a redução de impostos sem uma redução de gastos na mesma proporção (ou maior) acaba por não ser positiva, pois aumenta o défice orçamentário e, consequentemente, o endividamento. O governo, portanto, suga mais recursos da economia (o valor do endividamento e os juros que tem de pagar para mantê-lo). As pessoas passam a pagar mais caro para financiar o governo, apesar de estarem a pagar menos impostos diretamente.

 

A agência também menciona que a dívida pública portuguesa “diminuiu acentuadamente” no ano passado para 113.9% do PIB, e estima uma redução neste ano para 109.1% do PIB e para 105.4% em 2024. Mas “apesar desta tendência de queda”, a Fitch sublinha que o rácio da dívida continua a ser o segundo mais alto na categoria de rating BBB.

 

Num contexto de aumentos de taxas de juro pelo BCE, a Fitch nota ainda que a dívida das famílias aumentou substancialmente – já que 90% das hipotecas têm taxas variáveis (pós fixadas) – e este endividamento permanece cerca de 6% acima da média da zona euro.

 

Em 10 de março, a agência Standard & Poor’s (S&P) também manteve inalterado o rating da dívida pública portuguesa. Em setembro de 2022, a S&P elevou o rating de BBB para BBB+ (três níveis acima de “lixo”).

 

Em novembro de 2022, a Moody’s também manteve inalterado o rating da dívida pública portuguesa, em Baa2 (dois níveis acima da classificação “lixo”), com perspetiva estável. Veja aqui a tabela de rating da Moody’s.

 

Em janeiro, a DBRS manteve o rating da dívida pública portuguesa de longo prazo em A (baixo) – com tendência estável, após ter elevado de BBB (alto) para A (baixo) em agosto de 2022. Veja aqui a tabela de rating da DBRS.

 

A Moody’s, portanto, foi a única das quatro grandes agências que não aumentou o rating da dívida pública portuguesa em 2022, mantendo o rating (Baa2) dois níveis abaixo do rating da DBRS (A – Low) e um nível abaixo dos ratings da S&P e da Fitch (ambos BBB+).

 

Standard & Poor’s, Moody’s, Fitch (agências americanas) e DBRS (agência canadense) são as principais agências de classificação de risco do mundo. Porém, não são isentas de erros. Um exemplo é o caso dos CDO’s, na bolha imobiliária da década de 2000 nos EUA, explicado pelo economista Leandro Roque. Para compreender isto, é necessário descrever o processo de securitização dos empréstimos imobiliários (através do qual ativos detidos por Fannie Mae e Freddie Mac eram reunidos e revendidos a investidores e instituições financeiras nacionais e estrangeiras). Porém, havia a junção de ativos de baixo risco (mutuários com bom histórico de crédito) e de alto risco (mutuários com histórico ruim ou inexistente). Esta junção formava o derivado chamado Collateralized Debt Obligation (CDO). Desta forma, estas instituições aumentaram suas alavancagens e risco de falência, pois detinham, em seus balanços, ativos altamente arriscados.

 

Estes ativos recebiam classificação de risco máxima, a chamada ‘grau de investimento’ (S&P, DBRS e Fitch: AAA; Moody’s: Aaa). Estas agências são estritamente reguladas pela SEC (Securities and Exchange Commission, o equivalente a CMVM em Portugal e a CVM no Brasil), com poder para limitar a entrada de concorrentes neste mercado, através de longos processos burocráticos e regulatórios que impedem o surgimento de concorrência. Desta forma, não possuem incentivos para rebaixar as classificações de ativos que prejudicariam direta ou indiretamente o governo (como as Mortgage Backed Securities – MBS’s, ativos hipotecários cuja valorização ocorria em função da expansão monetária) pois é este quem permite que operem em um ambiente não concorrencial, sem o qual poderiam perder seus altos lucros. E claro, o mesmo se aplica ao rating das dívidas públicas do governo, que em muitos casos, recebem uma boa classificação (em comparação ao verdadeiro risco que possuem).

 

Porém, isto não elimina a relevância do papel dessas agências no mercado financeiro. A classificação de risco da dívida de um país influencia a tomada de decisão de investimentos na mesma, sobretudo por parte dos investidores estrangeiros, que têm em atenção o comportamento da dívida devido ao risco que esta representa aos investimentos. Se a dívida cresce sem uma mínima sustentabilidade visível, aumentam as chances, por exemplo, de haver mais desvalorização da moeda, pois o governo pode vir a não poder arcar com os custos da dívida (já que a despesa com juros aumenta) e o banco central pode monetizá-la, desvalorizando a moeda e diminuindo os retornos reais dos investimentos (sobretudo os de longo prazo, que são mais produtivos e trazem mais crescimento económico). O rating destas agências também influenciam os investimentos por parte de grandes instituições financeiras e fundos de investimento, pois há certas regulações que exigem um certo grau mínimo de rating para que estas instituições possam investir em determinados ativos.

 

 

André Marques

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